sexta-feira, 19 de maio de 2017

DICAS PARA UM BOM POEMA

Oficina de Poesias


Dicas de Evelyn Heine para quem
quer fazer poesias divertudas 

Você sempre quis fazer suas próprias poesias, mas não sabia nem por onde começar? Seus problemas acabaram! Acompanhe nossas dicas para fazer desabrochar seu talento poético.
1. Sobre o que você quer falar?
Um bom assunto é aquele que está mexendo com você ultimamente. Pode ser qualquer coisa, qualquer sentimento. Poesia é uma forma de comunicação. Pode ser romântica, engraçada, de amizade... Você manda!
2. Soltando as palavras
http://www.divertudo.com.br/oficina/menino1.gifPegue um papel e vá anotando várias palavras que tenham a ver com o assunto. Tente achar rimas para elas. Não precisa pensar muito. Brinque de rabiscar palavras. Quanto mais, melhor. Depois você escolhe as preferidas.
3. A primeira frase
Você não precisa acertar logo de cara. É justamente a vontade de acertar de primeira que “emperra” o pensamento. Você é livre para escrever e apagar o que quiser, mudar tudo de lugar... Solte o verbo! Não tenha medo...
4. Como rimar?
http://www.divertudo.com.br/oficina/menino2.gifExistem vários jeitos de combinar rimas. Podemos, por exemplo, numa poesia de quatro linhas (A, B, C, D), rimar:
A com B e C com D (primeira com segunda e terceira com quarta), ou
A com C e B com D (primeira com terceira e segunda com quarta), ou
Apenas B com D (segunda com quarta linha).

Veja este exemplo:
EU QUERO UM MUNDO MELHOR,
UM MUNDO MAIS “SIM” DO QUE “NÃO”.
SERÁ QUE É TÃO COMPLICADO
VER O OUTRO COMO IRMÃO?

(Evelyn Heine)

O truque para deixar mais legal uma poesia é procurar palavras de tipos diferentes para rimar. “Irmão” é um SUBSTANTIVO e “não” é um ADVÉRBIO. (Viu como é bom saber Português?)
Não precisa ser na poesia inteira, mas, se conseguir, ótimo.

Veja como ficaria mais pobre deste outro jeito:
EU QUERO UM MUNDO MELHOR,
UM MUNDO COM MAIS UNIÃO.
SERÁ QUE É TÃO COMPLICADO
VER O OUTRO COMO IRMÃO?

(Evelyn Heine)

Reparou? "União" (SUBSTANTIVO) com "Irmão" (SUBSTANTIVO) não dá o mesmo efeito, não é?
Além disso, inventar novos papéis para as palavras enriquece sua poesia. Um “mundo sim” serve de exemplo porque transformamos o “sim” (ADVÉRBIO) em adjetivo.

OUTRA!
Vamos tentar, agora, uma poesia mais curtinha, só de três linhas, rimando A com C (primeira com terceira).

MEU CORAÇÃO ARDE... AI, AI!
TUDO CHOVE SÓ PORQUE
ELE ME DISSE UM BYE!

(Evelyn Heine)

Primeiro tive a ideia de rimar “AI” (onomatopeia de dor) com a palavra em inglês “BYE” (que se pronuncia “bai”). Não é legal?
Então... fui imaginando o que combinaria com “AI”.
Pensei na dor de uma paixão não correspondida.
Depois inventei a última linha (Ele me disse bye = foi embora) e ficou faltando a do meio.
Dei um jeito de ligar as duas com a que faltava.
Primeiro imaginei “isso tudo só porque”... mas aí veio uma frase mais forte – “hoje chove só porque”... – e outra melhor ainda (mais sentimento!): "TUDO chove só porque".
Viu só? A gente vai mudando até gostar do conjunto! Você precisa ficar contente com sua obra!

E ATENÇÃO!
Chover é um verbo que não tem sujeito. Por isso mesmo “tudo chove” causa impacto.
É impossível que as coisas chovam! Mas isso exprime a tristeza da situação. Por isso a poesia emociona mais do que dizer apenas: “estou triste porque ele não gosta de mim”.
http://www.divertudo.com.br/oficina/menino3.gif5. Não saia do ritmo!
Uma poesia também precisa ter ritmo.
Tente reparar se a leitura de sua poesia fica "gostosa" ou não.

EXEMPLO:
Ba-ta-TI-nha QUAN-do NAs-ce
Es-par-RA-ma PE-lo CHÃO


Viu que os sons mais fortes da primeira linha estão nos mesmos lugares que os da segunda?
Faça o seguinte: sua poesia não "encaixou" direito? Parece que fica uma "ponta" sobrando em alguma parte?
Então troque palavras por sinônimos, inverta a ordem delas... até seu ouvido ficar satisfeito.
Veja o ANTES e DEPOIS a seguir. Compare!
ANTES
PINGA O PINGO INSISTENTE.
PING, PING RITMADO
SÓ PARA AMOLAR A GENTE!
DEPOIS
PINGA O PINGO INSISTENTE.
PING, PING RITMADO
SÓ PRA AMOLAR A GENTE!
Reparou? Um mínimo detalhe fez MUITA diferença na hora de falar.
“Para” tem duas sílabas e “pra” tem uma só. Só isso já muda tudo. VEJA:
PIN - GAO - PIN - GO - IN - SIS - TEN - TE
SÓ - PRA - A - MO - LAR - A - GEN - TE

MESMO NÚMERO DE SONS!

http://www.divertudo.com.br/oficina/goncalvesdias.jpgVeja estes versos feitos por Gonçalves Dias:
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá;
As aves que aqui gorjeiam,
Não gorjeiam como lá.


Recite em voz alta. Reparou que tudo se encaixa?
Um dos truques é que cada linha tem o mesmo número de SONS.
Em poesia, um som é uma "sílaba métrica", diferente da sílaba normal. É diferente porque pode juntar letras de palavras vizinhas, assim:

"ON-DE CAN-TAO SÁ-BI-Á" (7 SONS)
"AS A-VES QUEA-QUI GOR-JEI (AM)" (7 SONS - o "AM" não conta porque é fraquinho)

Os poetas de antigamente quebravam a cabeça para cada verso ter um número certinho de sons!
Hoje isso não é uma obrigação. Também podemos fazer versos livres, sem tanta preocupação com a forma. Você escolhe!
http://www.divertudo.com.br/oficina/menino4.gif6. Treinando os ouvidos
Comece a prestar mais atenção às letras de músicas que ouve. Veja porque algumas rimas parecem melhores que outras.
Você sabia?
Uma rima feita com palavras do mesmo tipo (mesma classe gramatical), chama-se RIMA POBRE.
Já uma outra feita com palavras de tipos diferentes, chama-se RIMA RICA.
Melhor ainda se você rimar palavras com estruturas totalmente diferentes. Aí o nome é RIMA PRECIOSA (“vê-lo” com “cabelo”, por exemplo).
7. Desenhando com palavras
Veja só isso:
http://www.divertudo.com.br/oficina/sorria.png

As palavras podem formar desenhos que tenham a ver com o sentido! Não é legal?
O nome para isso é POESIA CONCRETA
“Concreto” é algo que existe mesmo.
Você também pode tentar criar suas poesias concretas. É divertido!
8. Outras figuras
E TEM MAIS! Em qualquer poesia, também dá para usar figuras SEM DESENHAR NADA.
Como assim? São figuras para imaginar. Por exemplo:

Um mar azul e calmo em minha alma.
É o mesmo que "Estou em paz, me sinto bem."

Percebeu?
Existe uma matéria, em Português, que se chama FIGURAS DE LINGUAGEM.
Tem uma porção de tipos e com elas podemos brincar com os sons das letras, com a gramática, com os sentidos das palavras...

Agora pegue um papel e uma caneta e ponha em prática o que você aprendeu.

Introdução

     Para escrever poesia, é preciso ler poesia e saber onde se encontra a essência dessa forma de expressão.

     A seguir, transcrevemos seis poemas (cuja autoria foi omitida). Pedimos que faça uma avaliação: atribua a cada um deles um conceito - ótimo, muito bom, bom, regular, fraco.

     Trata-se, evidentemente, de um teste: ele pode servir para avaliar a noção que você tem acerca de poesia


LUAR

A lua majestosa
passeia
no tapete das nuvens
na imensa quietude
do universo.


E com seus raios argentinos
rompe o véu negro da noite
com claridade branda e suave,
e faz da terra
um manto branco de virgem. 



LUA CHEIA

Boião de leite
que a noite leva
com mãos de treva
pra não sei quem beber.
E que, embora levado
muito devagarinho,
vai derramando pingos brancos
pelo caminho.
Haverá,
ainda,
no mundo
coisas tão simples
e tão puras
como a água
bebida na
concha
das mãos?
(Mário Quintana)



Chega mais perto e contempla as palavras.
Cada uma
tem mil faces secretas sob a face neutra
e te pergunta, sem interesse pela resposta,
pobre ou terrível que lhes deres:
Trouxeste a chave?

(Carlos Dummond de Andrade) 

Que é poesia

Que é Poesia?
        uma ilha
        cercada
        de palavras
        por todos os lados.

Que é o Poeta?
        um homem
que trabalha o poema
com o suor de seu rosto
        um homem
        que tem fome
        como qualquer outro
        homem.

               (Cassiano Ricardo)
O bicho

Vi ontem um bicho
Na imundície do pátio
Catando comida entre os detritos. 

Quando achava alguma coisa,
Não examinava nem cheirava:
Engolia com voracidade. 

O bicho não era um cão,
Não era um gato,
Na era um rato.
O bicho, meu Deus, era um homem. 

               (Manuel Bandeira)

A vida é feita de nadas;
De grandes serras paradas
À espera de movimento;
De searas onduladas
Pelo vento;
De casas de moradia
Caiadas e com sinais
De ninhos que outrora havia
Nos beirais;
De poeira;
De ver esta maravilha:
Meu Pai a erguer uma videira
Como uma Mãe que faz a trança à filha. 

               (Miguel Torga)


Coisas

Uma rãzinha verde no gris da manhã...
Um sorriso na face de um ceguinho...
Uma nota aguda como uma pergunta de criança...
Um cheiro agradecido de terra molhada...
Um olhar que nos enche subitamente de azul... 

               (Mário Quintana)

Gastei uma hora pensando um verso,
que a pena não quer escrever.
No entanto, ele está cá dentro
inquieto, vivo.
Ele está cá dentro
e não quer sair.
Mas a poesia deste momento
inunda minha vida inteira.

               (Carlos Drummond de Andrade)

A sucessão de sílabas tônicas e átonas com intervalos regulares cadenciam o verso, tornando-o melodioso.


4. Os versos agrupam-se dentro de uma fórmula especial.

     duas primeiras estrofes contêm quatro versos cada uma e as duas últimas, três. A essa disposição dá-se o nome de 
soneto.


5. Há a repetição intencional da expressão 
de repente, e do verso de repente, não mais que de repente.

     A reiteração mencionada, além de dar ritmo e melodia ao poema, é uma maneira (insistente) de o poeta expressar como se deu a separação.


6. Há a utilização de figuras como a antítese, a comparação, a metáfora.

Antítese
A antítese consiste na aproximação de palavras ou expressões de sentido oposto. Observe como o poema de Vinícius de Moraes é antitético: 


riso x pranto
calma x vento
amigo próximo x o distante


Comparação
A comparação, como o próprio nome diz, é o fato de confrontar, de estabelecer semelhanças entre seres ou coisas, tendo por finalidade tornar mais clara, mais compreensível e mais expressiva a idéia que se quer expressar:

     De repente do riso fez-se o pranto
     Silencioso e brando como a bruma

Metáfora
Metáfora é o uso de uma palavra ou expressão num sentido diferente daquele que lhe é comum. As metáforas, portanto, por serem palavras e expressões usadas em sentido figurado devem ser "traduzidas", ou melhor, bem decodificadas. 


METÁFORAS
(linguagem artística)
DECODIFICAÇÃO
(linguagem comum)
De repente do riso fez-se o pranto
De repente a felicidade virou tristeza
De repente da calma fez-se o vento
De repente a paz virou desarmonia


     O quinto poema também é de Gil Dumont Vêneto. Tem rima. Tem ritmo: é uma valsa. É romântico. É delicado. Expressa o amor. Com certeza, agrada à maioria dos jovens. Mas não é poesia!


     Não basta rimar para escrever poesia. Não basta ter ritmo para ser poesia. Um texto não é poesia por ser romântico, por emocionar, por ser uma declaração de amor.

     Poesia é palavra, é linguagem, é invenção verbal, é originalidade. E no poema "Amor" não há isso. Há só lugares-comuns.


     "Tanger de mansinho", "ternos versos", "berço de rosas macias", "sono formoso", "ao som das cantigas que a brisa cicia", "ao som das espumas e das ondas do mar", "música leve do teu respirar", etc. são exemplos de que não há invenção verbal, exemplos de lugares-comuns, de expressões que, de tão repetidas, se tornaram gastas, surradas, sem originalidade.


     O sentir, o amar, o apaixonar-se é comum a todos; cabe ao poeta expressar o sentimento, o amor, a paixão de uma maneira singular. Tudo já foi dito. O poeta expressa o que foi dito mediante uma forma inusitada.


     Para finalizar, Manuel Bandeira, em "Consoada", dá uma lição de poesia.

     Em dez linhas apenas, com palavras simples, conhecidas (com exceção, talvez, de "consoada", "caroável" e "sortilégios"), expressa sua preparação para receber a morte (a Indesejada das gentes), que vem para um último encontro, para uma "consoada" (refeição ao final do dia) e encontrará o poeta com o dever cumprido ("encontrará lavrado o campo") e preparado para recebê-la ("a casa limpa, a mesa posta, com cada coisa em seu lugar.").


     Não há rimas (a rima nem sempre é a solução). Os versos não apresentam o mesmo número de sílabas. O ritmo não é marcado. Isso tudo não importa. O que confere "status" de poesia ao poema é a maneira peculiar (a linguagem figurada) com que o poeta expressa sua alta preparação para receber a morte, que vem para um "jantar", um encontro a dois, e "Encontrará lavrado o campo, a casa limpa, / A mesa posta, / Com cada coisa em seu lugar."


     Ao concluirmos esta seção, queremos sublinhar, uma vez mais, o seguinte: para escrever poesia, é preciso ter cuidado especial com a forma, com a maneira de expressar, explorando com originalidade todos os recursos que o sistema lingüístico oferece nos planos fônicos (rimas, ritmos, etc.), léxico (escolha das palavras), sintático (combinação de palavras de forma inusitada, singular) e semântico (emprego da linguagem figurada, etc.), revelando assim novas formas de ver o mundo.

     Poesia é isso: uma aventura de linguagem. A arte de dizer o comum de forma incomum.

     O texto poético assim construído se torna intocável, isto é, as palavras que o autor utilizou, as combinações que fez, os recursos que empregou não podem ser alterados sob pena de comprometer a obra, desconstruí-la, despoetizá-la.

     Cabe lembrar, para encerrar, que um texto em forma de prosa pode ser considerado poesia, se a função predominante for a função poética, se nele estiver presente a linguagem poética. Trata-se de um texto em prosa, em sua forma; poesia - em sua essência. Dito de outro modo é prosa poética.



10 dicas para criar um poema

Gostar de ler poesia: É necessário que você adquira o hábito de ler poemas. Cercar-se de bons autores, discutir com seus amigos, ler em voz alta, tudo isso prepara a sua herança cultural.

Ser versátil e curioso: Não existe regra para temas poéticos. Tudo o que é o nosso mundo rende um poema. Não existe inspiração apenas para temas distantes e abstratos. Até um cisco no olho pode render um poema.

Conhecer as regras é fundamental: entender dos processos e técnicas, mesmo que você não as use, abre um leque maior de possibilidades. Livros sobre teoria, os mais básicos, não são chatos. E oferecem exemplos maravilhosos.

Use a imaginação: poema é uma janela para as imagens. Tente visualizar tudo o que dirá num poema. Não estranhe se as imagens parecem dizer algo além da lógica. Poesia não é uma aula didática, não precisa explicar nada. Você precisa apenas mostrar o novo e ver beleza nisso.

Leia o dicionário: é um amigo para a vida toda e com uma vantagem extra, ele gosta de ser usado. Quanto mais palavras você acrescentar no seu vocabulário, melhor dirá uma imagem, uma idéia. Poesia é feita de palavras, lembre-se disso.

Veja e observe outras formas de arte: vá a uma exposição, veja um bom filme, leia quadrinhos. A arte é combinável e tudo está interligado. Preparar seu espírito para uma visão artística é como exercitar todo dia os músculos do seu corpo. Você jamais perderá a disposição.

Aceite o olhar do outro: Não se tranque numa concha, achando que fez uma obra-prima e que só a sua opinião importa. Poesia não é expressão com a finalidade de apenas mostrar o que está sentindo. Poesia é linguagem elevada a potência máxima e como tal, depende de recursos expressivos. Aceite críticas, inclusive as suas.

Rabisque e revise: poema é sujeito a versões e revisões. Uma idéia nunca fica pronta de vez. Faça esboços, anote tudo, corte, edite. Poesia é como montar um quebra-cabeça.

Tudo tem mais de um ângulo – Não caia na tentação em dizer o óbvio. Não dê nada mastigadinho para o leitor. Não suborne sua inteligência. Dizer de uma forma diferente algo que está dentro de você é 100% mais eficiente do que cair em lugar comum. Não crie preconceitos em poesia. Diga e ouse o novo.

Poesia também é humor – Nem pompa demais, nem bagunça ao extremo. A linguagem pede para desapertar o cinto. Não seja nobre demais. Você não vai discursar, vai cantar a beleza da linguagem. E com esta lição, seja breve, seja enxuto.

(Texto   apresentado em palestra no Senac-PB em evento realizado para alunos)


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